Para o intelectual Ailton Krenak, o cenário “apocalíptico” que o país enfrenta nas últimas semanas por conta da nuvem de fumaça que cobre a maior parte do país é resultado de uma cultura propagada durante a gestão de Jair Bolsonaro (PL).
Confira parte da conversa:
Krenak: Eu te falei que eu passei por Sorocaba, os três dias que eu fiquei em Sorocaba eu não vi o céu, e quando o sol vai se pondo, você vê um fogo no céu, parece que nós estamos assistindo uma espécie de apocalipse. Uma baixaria a gente ter chegado a esse termo. O clima global está quente, mas a gente não precisava tacar fogo na floresta do jeito que estão fazendo, né?
Programa Bem Viver: Então não é possível chegar no futuro ancestral?
Krenak: O futuro ancestral não aponta em nenhuma direção como na ideia de futuro que historicamente foi compreendida, a ideia cartesiana de futuro. O futuro ancestral não é uma prospecção no espaço, no tempo. A gente tem que conhecer o nosso passado. Nós temos de ser capazes de resgatar tudo que nós temos de conhecimento, saberes, tecnologia, compreensão da vida pra gente ser capaz de dar conta de habitar a terra que a gente já falou, ela está esquentando, ela não vai oferecer as mesmas condições climáticas para os nossos filhos. Imaginar o futuro como um lugar para onde nós estamos indo prospectivamente é um equívoco, a gente vai continuar comendo a terra se a gente achar que nós estamos indo para algum lugar.
Programa Bem Viver: Esse fogo se alastrando pelo país com muitos indícios de ser criminoso e ordenado por grupos te parece um fenômeno novo no Brasil ou ele sempre existiu e a gente que não percebia como estava tomando essas proporções?
Krenak: Não, ele nem sempre existiu. Nós sempre fomos recebidos com um país de muitas florestas, com a Mata Atlântica, com o Cerrado, com a floresta amazônica… Agora nós estamos com vários biomas sendo depredados, sendo destruídos. E a gente pode agradecer isso a um sujeito que tocou o Ministério do Meio Ambiente e que dizia que era pra abrir a porteira.
Programa Bem Viver: É possível dissociar o que está acontecendo nesse momento, do que foi propagado, impulsionado nesses últimos quatro anos de governo Bolsonaro?
Krenak: Claro, porque quando você propõe uma coisa, isso não acontece na hora. Isso fica pairando, se fica reverberando, as pessoas fazem boca a boca, isso vira uma espécie de cultural local. Além de desestruturar todo o serviço de vigilância e controle, né? O ICMBio foi praticamente desmontado, o Ibama, as agências de controle, todo mundo ficou desmantelado, criou um vácuo. Agora esse fogo está se espalhando no vácuo criado por essa cultura predatória.
Programa Bem Viver: E o senhor acredita que essa gestão Lula com Marina Silva, Sônia Guajajara e outros expoentes da luta ambiental tem conseguido combater essa cultura a qual o senhor estava se referindo ou ainda é pouco para avaliar?
Krenak: Eu prefiro pensar em outros termos. Eu prefiro pensar que a realidade brasileira está ainda dividida, tem muita gente que não tem o menor respeito pela transição que a gente fez entre uma ameaça de uma ditadura e o esforço de redemocratizar a vida brasileira. E a gente está longe de uma pacificação, não dá pra avaliar nada.
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